Pianista Cego

poema de José Lázaro da Silva

Imagino o hino do meteoro sonoro de sua unha carmim voando rápido pelo teclado marfim…
O piano não vejo, cores quem vê invejo, mas notas sim, notas de sino, notas ensino, sim!
Cego sou e serei, cego lida com som; siga a linda canção, sereia; acorde, piano, acorde!
Eu piano acordo sim, meus acordes farão o clima, e a rima; mestre merece sonho que tece.

Com minha vareta prata evito a valeta, nas trevas encontro a rota, sua horta, sua porta.
Treva sem lume, trovas sem nome, até o piano vou guiar-me, ou perder-me com seu perfume!
Ouço seu caminhar, sem na vista registrar, um tapete se amassa, quando sua beleza passa!
Beleza que vistas penetrantes sabem afagar, minha triste mente tristemente vai imaginar.

Você senta-se devagar, na banqueta almofadada; só uma saia rodada de seda diz flu-sá-sá!
Sem pedal deixo-a tocar, com pedal deixo-a tocar, sua mão deixe-me tocar para ensinar…
Longas notas a saborear, belos vales e montes iremos sobrevoar, basta dedilhar e sonhar!
Uma eternidade sem vê-la, minha cegueira é a barreira, mas o som é um abraço, é um laço!

Da luz fugir, deixe-se em minhas trevas fluir! No espaço a melodia guiará seus passos…
No frio da madrugada, abandonada, solitária, note o silêncio, anote as notas no coração.
Elas trarão de volta à vida alegrias só nossas, e nossas novas vistas em sonhos estarão.
Na floresta florida, canários de ouro nos galhos gotejados de prata, em sonhos eu verei.

Scroll to Top