Tags: BrunoAngelo, CriaçãoMusical
Entre os estudiosos da globalização, uma questão que frequentemente vem à tona é aquela da identidade cultural. Com tantos cruzamentos de coisas em nosso cotidiano, frequentemente misturadas ou sobrepostas, às vezes é bastante difícil dizer aquilo que nos define: se falamos inglês ou português (ou ainda outras línguas), se somos nacionais, internacionais ou regionais, qual o nosso tipo de comida, de roupa ou de música, se estamos on- ou off-line. Estudos recentes apontam que a resposta mais adequada a essas perguntas é necessariamente inconstante, isto é, assumimos, trocamos e mesclamos diferentes identidades conforme nossos interesses ou necessidades, e nem sempre nos damos ao trabalho de tentar defini-las, pois na maioria dos casos é difícil que se resumam a um único contexto cultural. O sociólogo argentino Néstor Canclini chama isso de “multiculturalismo intraduzível”, e, consequentemente, afirma que “toda política cultural é uma política sobre os imaginários que nos fazem crer semelhantes”.
Na contramão dessa tendência, há um imaginário que se quer bastante homogêneo, que é aquele imposto ao artista ou, no caso que nos interessa mais de perto aqui, do compositor. Espera-se dele uma identidade, isto é, que ele seja fiel a si no ato criativo, mantendo-se alheio às pressões de mercado, aos clichês ou automatizações do fazer musical. Essa ideia está implícita, por exemplo, na expressão “encontrar sua própria voz”, comumente entendida como objetivo maior de quem cria música.
Mas há muitas formas de se criar, produzir e comerciarlizar música. Você pode utilizar partituras, ou pode trabalhar com improviso. Pode compor em DAWs (Digital Audio Workstations – Plataformas digitais de áudio), como o Reason, ou pode criar em grupo, com sua banda. A experiência me diz que cada um desses caminhos leva a resultados muito diferentes, e o mais provável é que, durante suas atividades musicais, você vai misturar todos ou vários deles, conforme sua conveniência. Você precisa fazer músicas diferentes para ocasiões diferentes e, mais importante, você passa por mudanças constantemente (estados de espírito, objetivos pessoais, experimentação de coisas novas, etc.). Como então definir uma identidade única?
No meu caso, desisti de buscar essa identidade estável: aceitei-me como sendo vários Brunos, e estamos bem assim, obrigado! Se você navegar um pouco por meu portfolio, encontrará ali músicas de vários estilos e matizes, algumas mais experimentais, outras mais pop; algumas em partitura, outras eletrônicas; algumas para o concerto, outras para vídeos, espetáculos ou shows. Curiosamente, no entanto, pensando em toda essa variedade, não me sinto superficial ou me “vendendo” às circunstâncias alheias ao meu ser. Consigo me perceber de forma sincera em cada uma dessas peças, por mais diferentes que sejam entre si, e isso nos coloca frente a um paradoxo interessante: afinal, tenho minha identidade ou estou dividido em muitos? A resposta, para mim, passa por uma inversão de perspectiva, ou seja, não é a minha “identidade”, como algo em si, que vai passar magicamente para a música que eu faço. Pelo contrário, são as músicas que eu faço que, com o passar do tempo, vão definindo e redefinindo a minha identidade como compositor. O tempo, essa coisa que inventamos para explicar a mudança das coisas, é a chave para entender essa identidade dinâmica e contínua, que hoje é uma coisa, mas amanhã pode vir a ser outra, embora não deixe de ser a mesma. Faça as suas músicas do jeito que vierem, considere as circunstâncias que envolvem seu trabalho e descubra, através do passar do tempo, as identidades maravilhosas que você é!
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